Recuperação Judicial – Lições preliminares – Lição VIII

Lição VIII – Verificação e Habilitação de Créditos

O procedimento de verificação e habilitação tem por escopo definir os créditos que estarão sujeitos à recuperação, seu valor e sua classificação, e será realizado pelo Administrador Judicial (art. 7º da Lei nº 11.101/2005 – Lei de Recuperação e Falências – LRF). São os credores que decidirão sobre a aprovação ou não do plano de recuperação (em assembleia geral), mediante votação por classes, cujo quórum, de regra, baseia-se no valor do crédito; mister, pois, que tais elementos estejam bem acertados nos autos: titular, valor e classificação do crédito.

A verificação de crédito tem sua gênese logo no início do processo (principal) de recuperação, e desenvolve-se concomitantemente a esse. Primeiro, teremos uma fase administrativa, e depois uma fase judicial. Como veremos, nossa legislação adotou o sistema das três listas, ou três relações de credores: a primeira confeccionada pela recuperanda; a segunda pelo Administrador Judicial e a terceira e última (quadro-geral de credores) pelo juiz (que, na verdade, apenas a homologa).

Na fase administrativa, o procedimento de verificação de crédito começa com a publicação da relação de credores apresentada pela devedora (recuperanda). Entre os vários documentos que devem instruir a inicial, por exigência do art. 51 da LRF, está a relação de credores (inciso III). Ao deferir o processamento da recuperação judicial, o juiz determina a publicação de edital contendo esta lista (art. 52, §1º, II, LRF).

Contado da publicação deste édito, começa então o prazo de 15 (quinze) dias para que os credores possam apresentar habilitações de crédito ou divergências. Mas, atenção. Como estamos na fase administrativa, estas serão apresentadas ao Administrador Judicial, em seu escritório; não perante o juízo. Não deve, pois, o credor ingressar sua habilitação de crédito tempestiva ou divergência no protocolo judicial; trata-se de equívoco. O § 1º do art. 7º da LRF é expresso em afirmar: os credores terão o prazo de 15 (quinze) dias para apresentar ao administrador judicial suas habilitações ou suas divergências quanto aos créditos relacionados (pela recuperanda). Por segurança, poderá o juiz determinar ao Administrador Judicial que, no dia seguinte ao término do prazo, relacione nos autos as habilitações e divergências recebidas.

No entanto, não se sabe por que, alguns credores, neste prazo, protocolizam suas habilitações no juízo da recuperação. Deverá, então, o magistrado condutor do feito concursal, em homenagem ao princípio da informalidade, determinar a remessa destas peças ao administrador judicial, certificando-se tal providência nos autos. Jamais deverá autorizar sua juntada.

Aliás, ao meu sentir, constitui pecado capital do magistrado determinar a juntada de petição nos autos da recuperação atinente à habilitação de crédito ou divergência. Isso provoca tumulto processual que, por vezes, inviabiliza até mesmo o manuseio dos autos. Definitivamente, qualquer discussão sobre a existência, valor e classificação de créditos não se processa nos autos principais.

Outrossim, é preciso distinguir a habilitação de crédito da divergência. Nesta, o crédito foi lançado na relação de credores elaborada pela recuperanda (1ª lista); no entanto, o credor discorda do valor ou da classificação aplicada. Já na habilitação, o crédito simplesmente não consta da lista. Ambas, como dito, são apresentadas ao Administrador Judicial, se não serôdias.

Urge consignar, ainda, que, se o crédito consta da 1ª lista no valor e classificação que o credor entende correta, carece ele de interesse processual para habilitação divergência; na prática forense, porém, tenho observado muitas habilitações em que o crédito pleiteado já consta da relação de credores da recuperanda (1ª lista) no valor e classificação pleiteada pelo habilitante, que sempre me causou espécie. Ora, se o crédito já foi reconhecido pela devedora e consta da sua relação de credores, para que habilitá-lo?

Nesta fase, por ser administrativa, fica dispensada a postulação por advogado, podendo o próprio credor subscrever tanto a habilitação de crédito tempestiva como a divergência; também não haverá recolhimento de custas. Deverá, contudo, o habilitante observar a forma prescrita no art. 9º da LRF:

Art. 9o A habilitação de crédito realizada pelo credor nos termos do art. 7o, § 1o, desta Lei deverá conter:

I – o nome, o endereço do credor e o endereço em que receberá comunicação de qualquer ato do processo;

II – o valor do crédito, atualizado até a data da decretação da falência ou do pedido de recuperação judicial, sua origem e classificação;

III – os documentos comprobatórios do crédito e a indicação das demais provas a serem produzidas;

IV – a indicação da garantia prestada pelo devedor, se houver, e o respectivo instrumento;

V – a especificação do objeto da garantia que estiver na posse do credor.

Parágrafo único. Os títulos e documentos que legitimam os créditos deverão ser exibidos no original ou por cópias autenticadas se estiverem juntados em outro processo.

Pois bem.

Recebidas as habilitações tempestivas divergências, o Administrador Judicial intensificará seu trabalho na verificação detalhada dos créditos. Fará minucioso trabalho nos documentos contábeis mercantis da devedora, no desígnio de atestar a regularidade dos créditos, velando para que não vigore eventual crédito simulado, ou fique de fora crédito sujeito à recuperação. Examinará, ainda, com desvelo, as habilitações tempestivas divergências apresentadas pelos credores, acatando-as integral ou parcialmente, ou as rejeitando. Com efeito, dispõe o art. 7º da LRF.

Art. 7o A verificação dos créditos será realizada pelo administrador judicial, com base nos livros contábeis e documentos comerciais e fiscais do devedor e nos documentos que lhe forem apresentados pelos credores, podendo contar com o auxílio de profissionais ou empresas especializadas.

Para esse minucioso trabalho, dispõe o Administrador Judicial de 45 (quarenta e cinco) dias. Trata-se, porém, de prazo impróprio, já que poderá ser prorrogado em havendo necessidade, não gerando qualquer nulidade a sua justificada dilação. No máximo, poderá causar sanções administrativas ao administrador judicial, dependendo do caso concreto e do tempo excedido.

Concluído, então, seu trabalho de verificação detalhada dos créditos, o Administrador Judicial fará publicar edital contendo a sua relação de credores (2ª lista). Veja-se que esta lista é de elaboração do Administrador, de modo que somente ele a assina, não em conjunto com o juiz. Será ela publicada no Diário da Justiça. O art. 191 da LRF ressalta que se a devedora comportar o ônusos editais serão também publicados em jornal ou revistas de circulação regional ou nacional. É preciso equidade por parte do condutor do feito, já que as listas de credores geralmente são de tamanho bastante para um preço elevado de divulgação em jornais, podendo onerar por demais a devedora, que já se encontra em situação de crise. Assim, na maioria das vezes, a recuperanda somente comporta a publicação no Diário da Justiça e, ainda, para pagamento das despesas ao final do processo. É preciso verificar caso a caso.

Publicado o edital contendo a lista de credores do Administrador Judicial, estará encerrada a fase administrativa da verificação de crédito.

Todavia, pode ocorrer, e geralmente ocorre, que determinado credor ou credores discordem da conclusão do Administrador Judicial, seja sobre a exclusão, inclusão, valores e classificação de qualquer dos créditos insertos na sua lista. Então, como a lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito (CF/88, art. 5º, inciso XXXVI), prescreve a Lei nº 11.101/2005:

Art. 8o No prazo de 10 (dez) dias, contado da publicação da relação referida no art. 7o, § 2o, desta Lei, o Comitê, qualquer credor, o devedor ou seus sócios ou o Ministério Público podem apresentar ao juiz impugnação contra a relação de credores, apontando a ausência de qualquer crédito ou manifestando-se contra a legitimidade, importância ou classificação de crédito relacionado.

Inicia-se, pois, a verificação de crédito judicial. Poderá então qualquer credor, o Comitê (se houver), a recuperanda, seus sócios ou o Ministério Público, ingressar com uma ação incidental denominada impugnação.

Não se trata de mera petição nos autos do processo de recuperação verberando o lançamento do Administrador, como soem proceder certos credores. Trata-se de ação judicial, postulada por petição subscrita por advogado, com antecipação prévia de custas (salvo quanto aos isentos), e deverá ser instruída com os documentos que detiver o impugnante. Será, obviamente, autuada em autos próprios. Sequer se recomenda sejam estes apensados (amarrados) nos autos principais, porque isso causa tumulto e prejudica o manuseio pelo juiz, Ministério Público, partes e serventuários.

Prescreve, porém, o art. 13, parágrafo único da LRF, que cada impugnação será autuada em separado, com os documentos a ela relativos, mas terão uma só autuação as diversas impugnações versando sobre o mesmo crédito.

Pertinente, neste instante, fazer a seguinte indagação: o credor que não apresentou habilitação ou divergência na fase administrativa poderá ingressar com impugnação?

A doutrina e a jurisprudência têm se mostrado uníssonas na resposta afirmativa. É porque, segundo o ordenamento pátrio, não se pode exigir o esgotamento da via administrativa para o direito de ação judicial, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da inafastabilidade do Poder Judiciário. Assim, mesmo não tendo formulado habilitação ou divergência no prazo de lei, poderá o credor irresignado com a relação de credores do Administrador Judicial (2ª lista) ajuizar impugnação.

Estando em ordem a inicial, verificado inclusive se as custas foram recolhidas, o juiz determinará o processamento da impugnação. Se o autor/impugnante estiver questionando crédito de outrem, este deverá ser intimado para contestar no prazo de 5 (cinco) dias, juntando os documentos que tiver e indicando outras provas que pretende produzir (art. 11). Se for o próprio crédito o impugnado (porque lançado a menor, p. ex.), esta intimação ficará prejudicada.

Em seguida, serão intimados para manifestar, também no prazo de 5 dias, a recuperanda, o Comitê de Credores (se houver). Por fim, também em quinquídio, o Administrador Judicial emitirá parecer fundamentado (art. 12). Não há necessidade de manifestação do Ministério Público, por ausência de previsão legal.

O juiz poderá determinar a produção de provas previamente especificadas pelas partes, oral inclusive, com a designação de audiência de instrução e julgamento. Mas isso somente ocorrerá se estritamente necessário. Bem verdade que nas lides empresariais soem os fatos comprovar-se por documentos, sendo a prova oral quase sempre despicienda.

Urge consignar que a redação do art. 15 da Lei nº 11.101/2005 é por demais confusa, exigindo-se exegese não literal, mas sim sistemática. Pelo texto, deveras, parece que todas as impugnações são juntadas em único auto, o que não é verdade, podendo haver várias impugnações, a depender de cada caso.

Dessarte, deverá o juiz julgar individualmente cada ação de impugnação. Tal julgamento não será necessariamente simultâneo, devendo o magistrado proferir sentença sempre que a causa (impugnação) estiver madura. Isto mesmo: o provimento que resolve o mérito da demanda de impugnação, ao meu sentir, é a sentença, porque põe fim ao processo (incidental). No entanto, andou mal o legislador ao qualificá-lo de decisão, prevendo, de consequência, o recurso de agravo de instrumento (art. 17 da LRF).

Ao julgar a demanda de impugnação, o magistrado acolhe, total ou parcialmente, ou rejeita o pedido, como nas demais causas. Se acolher, ainda que em parte, mandará o Administrador Judicial observar sua decisão ao consolidar o Quadro-Geral de Credores (3ª lista), lançando o crédito como conhecido. Como nas demais demandas judiciais, haverá ônus de sucumbência, devendo o vencido arcar com as custas processuais e os honorários do procurador da parte vencedora.

Decididas todas as impugnações, o Administrador Judicial consolidará o Quadro-Geral de Credores – QGC (3ª lista), nele constando os créditos e classificações constantes da sua relação (2ª lista) que não foram objeto de impugnação, e os créditos e classificação decididos pelo juízo nos feitos de impugnação.

Antes, porém, não podemos olvidar que, para a consolidação do Quadro-Geral é necessário também o julgamento prévio das habilitações retardatárias.

Como vimos no início, após a publicação da 1ª lista de credores (relação da devedora), os credores contam com 15 dias para apresentar habilitações de crédito divergência ao Administrador Judicial (fase administrativa). Mas não significa que o credor que perdeu esse prazo tenha perdido também seu crédito.

Poderá ele ingressar com Habilitação de Crédito Retardatária. Esta é judicial, devendo o ajuizamento se dar por intermédio de advogado, com pagamento de custas (salvo os isentos), instruída com os documentos que detiver o credor e a especificação das provas que pretende ele produzir (art. 10). O processamento é o mesmo da impugnação. Poderão ser ajuizadas desde o exaurimento do prazo de 15 dias da publicação da 1ª lista (relação da devedora), até a homologação do Quadro-Geral de Credores.

Abro aqui um parêntese para registrar outro pecado capital que o juiz condutor poderá praticar no feito de recuperação judicial: determinar o apensamento de todas as habilitações retardatárias. Noutras palavras: os inúmeros autos de habilitações retardatárias são amarrados por barbante aos autos principais, o que os torna quase que inviáveis ao manuseio, servindo isso apenas para causar perplexidade aos operadores do direito, que, ao receberem o amontoado de documentos, não raro entram em choque. Por isso, quase que invariavelmente, em todos os juízos temos aquele amontoado antigo de autos amarrados, que nada mais são que os processos de recuperação judicial e falência.

Digo, então, que é preciso sanear os feitos concursais. Necessário um critério rígido do que será juntado nos autos principais, o que será devolvido ao peticionário e o que será objeto de autos apartados. Nos autos principais de recuperação não se juntará petição cujo pleito se refira a inclusão, exclusão ou modificação de créditos. Aqui – nos autos principais – somente interessam as relações de credores (1ª, 2ª e 3ª listas). As demandas para que os credores nelas (listas) ingressem ou as modifiquem serão travadas alhures. Repiso: a habilitação tempestiva (administrativa) é pleiteada ao administrador judicial, enquanto a habilitação de crédito retardatária (judicial) faz-se por autos próprios. Assim, não há lugar para discussão de créditos nos autos principais da recuperação.

Registro que a pena para o habilitante de crédito retardatário, na recuperação, não me parece leve. Primeiro, deverá pagar custas, o que não o faria se, no prazo, tivesse habilitado seu crédito perante o Administrador Judicial. Segundo, com exceção dos trabalhistas, não terá direito a voto na Assembleia-Geral de Credores (art. 10, § 1º LRF). Esta segunda consequência se me afigura de extrema gravidade. Ora, perder o direito de voto, dependendo da situação e do valor do crédito, coloca o credor retardatário numa situação de assaz desvantagem em relação aos outros; deverá, na verdade, aceitar o que os outros decidirem sobre seu crédito. Por isso, salutar a atenção ao prazo para habilitação tempestiva (junto ao Administrador Judicial).

Retomo o procedimento.

Julgadas, pois, as impugnações e as habilitações retardatárias, aí sim, o Administrador Judicial consolidará o Quadro-Geral de Credores. Isto é, fará uma nova lista repetindo os créditos e a classificação da sua relação publicada (2ª lista) e não impugnados, e obedecerá as sentenças lançadas nos autos de impugnações e habilitações de créditos retardatárias, incluindo, excluindo ou modificando o crédito da forma ordenada pelo juiz.

Importante lembrar que eventual recurso das decisões proferidas nas impugnações ou habilitações retardatárias não possui efeito suspensivo, pois se trata de agravo de instrumento; salvo se o Tribunal competente liminarmente o conferir. Assim, o Administrador Judicial consolidará o QGC independentemente do trânsito em julgado das sentenças naqueles autos lançadas, observando o que nelas foi decidido ou o efeito suspensivo conferido pela corte ad quem.

Urge ressaltar que, na recuperação judicial, o valor do crédito constante do QGC não é necessariamente a importância que o credor futuramente receberá, pois o plano de recuperação poderá prever deságios, prazos diversos etc. Mas tem suma importância no exercício do voto. De fato, como vimos noutra lição, a importância do voto de cada credor, na maioria dos quóruns previstos na lei, é proporcional ao valor do seu crédito (critério qualitativo). Por isso, o legislador da LRF consignou:

Art. 17. Da decisão judicial sobre a impugnação caberá agravo.

Parágrafo único. Recebido o agravo, o relator poderá conceder efeito suspensivo à decisão que reconhece o crédito ou determinar a inscrição ou modificação do seu valor ou classificação no quadro-geral de credores, para fins de exercício de direito de voto em assembléia-geral.

Confeccionado o Quadro-Geral de Credores, o Administrador Judicial o apresentará nos autos para homologação do juiz. Não se fará prévia publicação, com reabertura de prazos para questionamentos. Não. A oportunidade para tanto já precluiu. O magistrado condutor do feito, verificando que o Administrador cumpriu suas ordens constantes das sentenças das impugnações e habilitações retardatárias, homologará o Quadro-Geral de Credores – QGC. De consequência, nele lançará sua assinatura (ao lado da assinatura do Administrador Judicial) e o fará publicar no Diário da Justiça.

Estão, assim, acertados os créditos, seus valores (com atualização monetária e juros até a data do pedido de recuperação) e a classificação. Ordinariamente, não mais serão alterados.

Mas o legislador foi benevolente, prevendo a possibilidade de retificação do QGC. Com efeito, dispõe o § 6º do art. 10 da LRF:

  • 6o Após a homologação do quadro-geral de credores, aqueles que não habilitaram seu crédito poderão, observado, no que couber, o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil, requerer ao juízo da falência ou da recuperação judicial a retificação do quadro-geral para inclusão do respectivo crédito.

Assim, mesmo depois de publicado o Quadro-Geral de Credores, poderá o credor que não habilitou seu crédito postular em juízo pela retificação do Quadro-Geral. Mas isso não se dará por mera petição nos autos da recuperação, nem por ação incidental. Requer-se ação ordinária processada nos moldes da legislação processual civil.

Também, nos casos de vícios do consentimento ou ignorância de documentos quando do lançamento do crédito, mostra-se possível a retificação do QGC, de igual modo por ação ordinária, nos termos previstos pela norma em estudo:

Art. 19. O administrador judicial, o Comitê, qualquer credor ou o representante do Ministério Público poderá, até o encerramento da recuperação judicial ou da falência, observado, no que couber, o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil, pedir a exclusão, outra classificação ou a retificação de qualquer crédito, nos casos de descoberta de falsidade, dolo, simulação, fraude, erro essencial ou, ainda, documentos ignorados na época do julgamento do crédito ou da inclusão no quadro-geral de credores.

A competência para processo e julgamento desta demanda é do juízo da recuperação, ou do juízo trabalhista, dependendo da natureza do crédito (§ 1º do Art. 19 da LRF).

Insta consignar que a doutrina e a jurisprudência pátria, à luz do disposto no § 2º do art. 6º da LRF, nos têm orientado quanto à verificação do crédito trabalhista reconhecido na Justiça do Trabalho. Firmou-se exegese segundo a qual os créditos reconhecidos na Justiça do Trabalho por sentença trânsita em julgado, e já definido o quantum debeatur, serão lançados no Quadro Geral de Credores independentemente do procedimento de habilitação ou verificação de crédito.

Basta, então, que o credor trabalhista apresente ao Administrador Judicial, com singelo requerimento, a certidão de crédito expedida pela justiça obreira. Esse entendimento muito se justifica, já que o juízo da recuperação jamais poderá rescindir a sentença trânsita em julgado proferida pelo juízo trabalhista. Então, por que instaurar um procedimento judicial de verificação, uma habilitação retardatária, p. ex., se o juízo competente para julgá-lo não poderá sequer modificar o valor do crédito? Não existe, na verdade, interesse processual do habilitante, devendo o Administrador Judicial simplesmente lançar o crédito já definido pela justiça especial.

O mesmo raciocínio, ao meu sentir, deve ser aplicado quanto aos créditos reconhecidos noutros juízos cíveis. Sabe-se que as ações de conhecimento não se suspendem em razão do processamento da recuperação judicial. Assim, para elucidar, suponhamos que numa ação de cobrança contra a recuperanda em trâmite na 5ª Vara Cível da Comarca de Imperatriz – MA, por sentença trânsita em julgado, seja reconhecido crédito, com liquidação definida. Para habilitá-lo na recuperação processada em Aparecida de Goiânia-GO, bastará ao credor, munido de certidão de crédito, solicitar ao administrador judicial a sua inclusão no QGC. Vale dizer, não haverá necessidade ou interesse numa ação de habilitação de crédito retardatária, porque o juízo da recuperação jamais poderá rescindir o aresto maranhense, sob pena de ofensa à coisa julgada e, de consequência, à vigente Carta Política.

Por derradeiro, devo constar que o Administrador Judicial, sempre que diante de situação ensejadora da retificação do QGC, deverá peticionar ao juiz, esclarecendo os motivos e juntando as provas. O magistrado, então, homologará a retificação, tantas quantas foram necessárias, devendo sempre ocorrer nova publicação do Quadro-Geral de Credores. Para controle e organização, salutar que as retificações recebam numeração de ordem crescente, v. g., “Quadro-Geral de Credores – Retificação 01”.

 

Por Dr. J. Leal de Sousa

Juiz de Direito

 

Aparecida de Goiânia – Goiás, maio de 2015

E-mail: jlealdesousa@gmail.com

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